Ionilda V. Carvalho*
Pode parecer difícil trazer essa palavra ao nosso vocabulário cotidiano, mesmo porque até bem pouco tempo talvez ela não fizesse parte de nosso dicionário mental.
As coisas estabelecidas como verdade, assim se mantinham por muito tempo, sedimentadas na dificuldade de investigação científica ou do pensamento.
As instruções eram elaboradas e organizadas, passando através das gerações como conquistas imutáveis.
No mundo de hoje, na grande transição em que estamos vivendo, situados em um turbilhão de descobertas, onde o homem inquieto amanhece muitas vezes em situações totalmente diversas daquelas em que se recolheu ao leito, é preciso ressignificar.
Ressignificar para ser capaz de reconstruir e mesmo construir.
Já não existem rumos traçados, verdades absolutas ou destinos inevitáveis.
A educação formal já não supre a sede de conhecimento e as instituições de ensino tradicionais se sentem incapazes de oferecer os subsídios necessários a esse ser que busca algo mais que informações.
Vencendo a incredulidade o homem saiu em campo para encontrar os conhecimentos que lhe preencham a alma e aí também se manifesta sua inquietude, não permitindo que ele se fixe onde não lhe permitem o diálogo, o raciocínio e a inquirição, pois que nada mais é como antes.
A casa espírita terá que se adequar a esse novo participante que chega ansioso por entender, trocar informações e principalmente construir uma nova rede de conhecimentos que possa trazer um significado real à sua existência.
Em meio à violência, ao desencanto, à tristeza e às perdas, o homem tem que estruturar uma nova ordem de pensamento e de significados para o cotidiano.
A percepção do tempo se encurtando e do espaço se desfazendo devido a sua agilidade de deslocamento, o apressam.
Nessa pressa presume que a conquista do poder, do bom e do melhor lhe saciarão a ansiedade e o furtarão à desilusão.
Quando a realidade se manifesta apresentando-se vestida de dor, vazio ou solidão, atordoado e não tendo a quem recorrer, muitas vezes foge da vida, encetando um grande caminhar em trevas, uma vez que a vida é estuante em todo o Universo.
É preciso que o grupo espírita esteja habilitado a recolher esse descrente, sem rumo e solitário ofertando-lhe algo mais que conceitos pré-estabelecidos ou visões preconceituosas. É preciso ofertar uma praça de diálogo, de compreensão e de afetividade, ressignificando o agrupamento religioso, que deixa de ser local de escolhidos para se tornar uma praça de diálogo entre os acolhidos.
Acolhidos pela doutrina que, dinâmica, permite e instrumentaliza o ressignificar da própria vida, mostrando a efemeridade das conquistas do material em detrimento da significação da bagagem espiritual.
Ressignificar a vida é trazer novo significado à morte, que se apresenta agora como uma troca de dimensões, para que o aprendizado de crescer possa se ampliar. É trazer novo significado ao grupamento familiar que passa a ser visto como um núcleo que trabalha sentimentos e emoções, criando laços de fraternidade que se estenderão ao longo das existências.
A sociedade passa a ser entendida como um grande buril, onde seres diferentes, com concepções e aprendizados diversos vão estabelecendo trocas que possibilitarão o progresso coletivo.
A violência, o desmando, a mentira e a insensatez assumem caráter transitório, característico das almas infantis e enceguecidas pela ignorância ou enredadas nas teias do desamor, da revanche e do ódio, que ainda assim estão a caminho da maturidade espiritual, propiciatória do grande encontro com o Amor.
A sombra, a privação e a miséria são, então, um convite aos homens e à sociedade para que os impulsos mais nobres se manifestem através da reestruturação da divisão dos bens materiais e intelectuais.
Em face do grande avanço intelectual e tecnológico do último século, o avanço do sentimento tem sido incipiente. Essa a grande responsabilidade que faceia a doutrina espírita. A responsabilidade de instigar e amparar o homem em seu trabalho de educação dos sentimentos e emoções.
Os espíritos têm trazido a informação sobre o período de transição em que estamos vivendo, sobre a necessidade de ressignificar os conceitos, as verdades e as certezas. Trazem ainda a disponibilidade de estarem nos amparando nessa difícil conquista de mudar a estrutura íntima através da educação da visão, audição e entendimento da realidade espiritual.
Permitamos sua presença amiga e acolhedora, através da mediunidade educada em bases de conhecimento, fraternidade e atenção. Reorganizemos nossas reuniões mediúnicas para que seus participantes se unam em clima de confiança, entendimento e carinho, promovendo trocas de informações e questionamentos entre encarnados e desencarnados como nos ensinou o mestre lionês. Todos seremos beneficiados, uma vez que a própria doutrina assim foi codificada.
“Ressignificar...Dar sentido novo em direção a um porvir de esperanças e completude interior.” (Eurípedes Barsanulfo – Lírios de Esperança).
Fonte: Revista Espírita de Campos nº 78.
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(* Ionilda V. Carvalho é
médica, professora universitária e oradora espírita em Campos dos Goytacazes - RJ.)